sexta-feira, 8 de agosto de 2014

Chucrute, rock e psicodelia!

Frumpy, banda de Hamburgo, que tinha nos vocais, a talentosíssima Inga Rumpf

É inevitável. Quanto mais tempo se passa numa cidadezinha qualquer deste mundão, mais se mergulha na cultura e história locais. Isso levando-se em conta, claro, todos os prós e contras, que sempre vem adicionais dentro da mala da experiência de vida. Nem tudo é divino e maravilhoso, e nem tudo é tão estranho assim. Com os sons que apresentei no último Wanderlust, desta quinta-feira, na On The Rocks, não poderia ser diferente!


Ao ir para a Alemanha pela primeira vez em 2003, meu conhecimento musical se limitava em flashes da apresentação de Nina Hagen, no Rock in Rio, de 1985, que eu via reprisar na Globo. E pronto. Ao entrar naquele cotidiano, a riqueza musical alemã foi se mostrando, se abrindo no horizonte e com sabor de chucrute mesmo! Sim, estou falando do Kraut Rock, um movimento de bandas experimentais, psicodélicas progressivas, que se destacaram no cenário rock germânico, entre as décadas de 60 e 70. Kraut significa repolho e esse termo foi criado pelo nariz torto da imprensa inglesa, para designar o movimento. No entanto, anos mais tarde, de significado pejorativo, o Kraut Rock passou a ser respeitado em cada canto da Europa, muito obrigado!

E claro, a psicodelia, rock progressivo e sons experimentais transpassavam fronteiras, entre os anos 60 e 70, sendo essas bandas as precursoras  e influências de tantos ingredientes que compõem  esse grande bolo do rock que temos hoje. Foram vanguardistas, ousados, sem medo de dizer a que vieram. Além da Alemanha, a trip sonora também foi até a Suíça, Inglaterra, Áustria e fechando com uma obra de arte na Turquia! Chega de papo. O rock progressivo, psicodélico, com chucrute, com cerveja, seja o que lá como for. A audição disso tudo se traduz em uma palavra: EXPERIENCE.
Por isso, feche os olhos e VIAJE:


IF

A banda inglesa durou seis anos e dividiu muitos palcos com feras como Cream, TRaffic, Yes e Lynyrd Skynyrd. Foi aclamada pela revista Billboard como a melhor banda e a mais importante no cenário rock progressivo britânico entre 70 e 75, com oito álbuns gravados e algumas tours pela Europa. 


CAMEL
Banda britânica de 71, lançando o primeiro álbum em 73 pela MCA Records, e encerram os trabalhos, numa turnê em 2003:


KROKODIL
A banda foi praticamente a primeira a levar o rock progressivo para a Suíça, entre os anos 60 e 70. Adoravam usar instrumentos exóticos, incluindo a sítara. Sim, os suíços entendem muito mais do que simplesmente como um bom chocolate é feito:


HOTZENPLOTZ
Com um som de 1971, banda politizada super crítica, que vem de Sttugart e que lançou apenas o álbum Songs aus der Show:


KRAFTWERK
Quando se podia dizer que a banda alemã, precursora das batidas eletrônicas, era praticamente uma outra banda, ao ouvirmos essa faixa:

FRUMPY
Baita banda de Hamburgo, que bombou entre 70 e 72 e posteriormente entre 90 e 95. Na época, a cantora Inga Rumpf foi aclamada como a mais talentosa vocalista individual e você vai entender o porquê:


KLAUS DOLDINGER'S PASSAPORT
Delicie-se com esse som de 1973, que vai te diexar de queixo caído com esse modesto solo de bateria, dupla!. Klaus é compositor, saxofonista e arranjador de Berlim:


FRIEDRICH GULDA & COMBO
Uma parada na Áustria para ouvir a beleza do pianista e compositor, arrebentando com um John Coltrane, mas que também se destacava no cenário erudito. Na década de 80, Gulda se juntou a Chick Korea:


ERKIN KORAY
O ícone Erkin figurou no cenário rock turco entre as décadas de 50 e 60 e que começaram a ganhar fama, ele e a banda, justamente por fazerem couver de Elvis Presley. ERkin introduziu o psicodelismo no cenário rock turco:

sexta-feira, 13 de junho de 2014

Hrvatska si nevjerojatna!

Croácia, você é incrível!


Plitvice Lakes, parque nacional situado no coração da Croácia, com cascatas e  bosques 

Ao pegar a mochila e sair por aí, sem destino, procurando trilhas sonoras pelo mundo, sei de cor que me surpreenderei nessa garimpagem. No Wanderlust #10, que vai ao ar todas as quintas-feiras, às 20h, pela On The Rocks, peguei carona na estreia da Copa do Mundo, no Brasil, e resolvi explorar a terra dos adversários que virão a enfrentar a seleção canarinho nessa primeira fase do campeonato, começando pela Croácia e com muito gosto por Plitvice Lakes, o parque nacional, patrimônio da Unesco, com mais de 16 cascatas e piscinas naturais interligadas. Ruim, né?

Encostadinho na Hungria, Bósnia e Sérvia, o país é banhado pelo mar Adriático, com penínsulas, baias e muitas ilhas. Além da riqueza natural, o cenário cultural croata também não fica atrás. Zagreb tem muitas bandas independentes, como por exemplo, o quarteto do An The Kid, que utilizam  também instrumentos acústicos:

And The Kid - On My Way Home


Passeando pelo ritmo sonoro croata, descubro uma bela dupla que fará parte do line-up do INmusic, festival de música, que acontece de 23 a 25 de junho, em Zagreb, muito bem quisto por ser um dos poucos que ressuscita  o espírito do Woodstock. Me refiro ao Ti, uma dupla de electro pop, que vem de Belgrado, mas tá sempre nos palcos croatas. O barato do clipe do som Koliko Dana é que ele foi gravado num domingo de primavera, em casa, mas precisamente, na cozinha, de pijama e com o café do lado. Faltou apenas um gato:

Ti - Koliko Dana


Viajei também pelo som do trio  progressivo-psicodélico Them Moose Rush. Da cidade de Bjelovar, ikola Runjavec (guita e vocais), Vedran Komlen (batera) and Branimir Kuruc (baixo) podem satisfazer o seu gosto por um rock mais ácido, com  os temas do último disco The Future Miss Sunshine:

Them Moose Rush - Darling


Gostou desta pequena volta pela Croácia? Curte, mesmo, por o pé na estrada em busca de novas ideias, experiências e paisagens lindas? Então todas as quintas-feiras, às 20h, eu e espero, no #Wanderlust, o programa para os que tem espírito viajante e são do mundo! Clica: http://www.ontherockswebradio.com/

"FOI Tetra, FOI Tetra"!




Era uma tarde nublada, fria. Lembro-me que a escola pública liberou a mim e meus colegas mais cedo para assistirmos o jogo Brasil x Holanda. Ao chegar em casa preparei uma tigela de pipocas, os cobertores e ao lado do meu parceiro oficial de partidas, meu irmão, não desgrudamos o olho da TV. Nunca fui uma aficionada por futebol, mas torcer pela seleção brasileira, quando se tem 11 anos é especial. E ver Bebeto e Romário espremendo a "Laranja Mecânica" seria um desafio sem preço! Não só fizemos suco daquela laranja - em jogo com arbitragem confusa e lances duvidosos - mas uma boa macarronada dos italianos ao chute para fora de Roberto Baggio, na fatídica cobrança de pênalti, naquela final. Acabamos com as pipocas, com as unhas, rogamos pragas, cruzamos os dedos ao gritos de " Vai errar, vai errar"!Imaginava piás, caiçaras, manézinhos da ilha, sertanejos, todos, fazendo a mesma mandinga. Deu certo. Colocamos a taça do tetra campeonato, que estava em solo norte-americano, na mala.


Gravado na minha memória afetiva, o mundial já retratava, naturalmente, um  outro cenário profissional que não aquele dos anos 50 e 60, quando jogadores de futebol recebiam grana na boca do caixa, não ficavam ricos, e tinham outros empregos. Hoje, a multidão de meninos pobres que aos 8 anos, além de desenvolver seu talento, já carrega a responsabilidade de satisfazer sonhos e expectativas de uma família inteira, cresce de forma absurda. Menos de 1% torna-se Neymar, embora a ideia nos seja vendida de forma errônea. A maioria recebe um pouco mais dois salários, paga sua passagem de ônibus para o treino, fica na mão de empresários e de chantagens diárias, quando não necessita comprar os próprios pratos e talheres para poder comer no centro de treinamento do clube, como já aconteceu com o zagueiro da atual Seleção Brasileira, Dante Bonfim. De igual forma, estripulias de entidades imperativas, cartolagem e contra-cheques astronômicos não se justificam. Uma boa dica de filme sobre todas essas realidades é o documentário produzido em parceria Brasil- Alemanha, que chega às telas durante este Mundial, MATA-MATA.

Ontem à noite, rodei o #10 Wanderlust, na On The Rocks, dia abertura de Copa do Mundo, e no Brasil. No programa, mostrei novos sons do nosso país e de seus adversários nessa primeira fase do campeonato: Croácia, México e Camarões. Nossa fusão de etnias e costumes, o apreço por elas, também se transforma, aumenta. A originalidade e beleza da nossa cultura vem sendo aceita e respeitada na sua heterogeneidade e nos é valiosa. Por isso abri o bloco com o som do grupo de Recife, ator principal do movimento Manguebeat, que emergiu nessa mesma época em que eu torcia pela Seleção de Dunga, a Nação Zumbi:

Nação Zumbi - Foi de Amor



O grupo já estava há sete anos sem lançar um novo disco, mas entrou com o pé na porta, tendo na produção o Berna Ceppas, o Kassin e a participação de Marisa Monte, na faixa, A Melhor Hora da Praia. Dengue, Pupillo, Lúcio Maia, Jorge du Peixe, Gustavo da Lua e Gilmar Bolla 8 estão quebrando tudo! Mas não só de antigas, e boas levas, vive a cultura musical brasileira.

Cada vez mais, trabalhando de forma coletiva (leia-se músicos que se unem para se divertir), Graveola e o Lixo Polifônico é daquelas bandas que concatena ideias, inspirações, de forma política, crítica, sublinhando a riqueza das culturas regionais. E eles experimentam, sem medo. Timbres recheados, arranjos bonitos e letras pensantes, inteligentes:

Graveola e o Lixo Polifônico - Blues Via Satélite



Ainda sobre trabalho colaborativo e bandas numerosas (a Graveola tem seis integrantes), uma das minhas gostosas descobertas no último ano está os amigos que se conhecem desde a adolescência, Pitanga em Pé de Amora. O som desses paulistas, que lançaram seu primeiro álbum em 2011, é de uma qualidade tremenda:

Pitanga em Pé de Amora - Ceará


Na boa safra que a terra da garoa vem nos presenteando, está O Terno, um trio irreverente formado pelos figurões Tim Bernardes, Guilherme d'Almeida,e Victor Chaves.  O single Tic-Tac faz parte do EP Tic-Tac Harmonium. Como eles se definem: "Roquenroll":

O Terno - Tic Tac




E apara arrematar o bloco de bons sons brasileiros, no Wanderlust, eu rodei o lançamento que saiu na quarta-feira e que faz parte do novo disco, intitulado Policromo, a canção Geografia Sentimental do grupo 5 à Seco. A composição de Leo Bianchni e Vinicius Calderoni já está disponível para download no portal da Natura Musical.

5 a Seco - Geografia Sentimental




Diante de tanta diversidade, que continuemos sendo verde-amarelo, mas também azul e branco. Que a gente continue se entendo mesmo dizendo pão e cacetinho, macaxeira ou mandioca, vestida de prenda ou pronta com uma sombrinha, para o frevo. Que a gente abuse das palavras "inclusão, distribuição, colaboração", para difundir essa beleza musical tão peculiar, tão nossa. Tropicália, Bossa Nova, Manguebeat, tudo junto e misturado. Mas para chegar até aí, que continuemos a desempoeirar nossos livros e discos, e que saibamos contar e manter viva a nossa história, lembrando não somente quem foi Dom Pedro, mas em quem votamos a cada corrida às urnas, para que possamos, aí, dar um próximo e belo drible.

sábado, 7 de junho de 2014

On the road

Estação férrea de Santa Maria- RS


"Penso que passei por muita coisa na vida e agora penso que encontrei o que é necessário para a felicidade. Uma vida tranquila e isolada no campo, com a possibilidade de ser útil à gente para quem é fácil fazer o bem e que não está acostumada que o façam; depois trabalhar em algo que se espera tenha alguma utilidade, depois descanso, natureza, livros, música, amor pelo próximo - essa é minha ideia de felicidade. E depois, no topo de tudo isso, você como companheira e filhos talvez - o que mais pode o coração de um homem desejar"? 


O trecho de Felicidade Familiar, de Tolstoi, foi uma das últimas leituras de Chris McCandless.O rapaz marcou vários trechos da obra, inclusive este acima, que o emocionaram. Já, a minha emoção, foi chegar ao fim das páginas de  "Na Natureza Selvagem", escrito pelo jornalista e alpinista americano Jon Krakauer. A história de Chris, ou melhor Alex Supertramp, adaptado em filme e dirigido por Sean Pean em 2007,  com a trilha sonora fantástica de Eddie Vedder, divergiu opiniões. Enquanto para muitos o episódio foi símbolo de heroísmo, despreendimento, para os nativos da região - o jovem resolveu desbarvar sozinho a selva alasquiana com pouca comida e equipamentos - algo estúpido, trágico e completamente inconsciente! Ainda que com final inesperado, para o próprio Chris, entrar no Stampede Trail - o longo caminho para o interior do Alasca - o levou, na verdade, para dentro de si mesmo. Por isso, aos que não leram ou viram o filme, essas é uma daquelas oportunidades que lhe traz a certeza de que o importante nunca é o destino de uma viagem, dropar uma onda, chegar ao alto do cume e observar a beleza que a natureza nos emana, e sim, o trajeto que se fez para chegar até tudo isso.

E foi imaginando Chris, rumo ao Alasca, na beira de uma daquelas estradas retas sem fim, no meio do nada, com chuva ou sol a pino, apenas com alguns pertences nas costas é que abri o #9 Wanderlust, na última quinta-feira, On The Rocks, com uma trilha sonora andarilha, para os que pensam em colocar o pé na estrada, de carro, ou erguendo o dedão mesmo. Comecei com um clássico do norte-americano, responsável pelo soundtrack do filme Paris Texas, de Wim Wenders, o compositor e guitarrista Ry Cooder.

Ry Cooder - Paris Texas





Em seguida, lembrei de outro filme sensacional, Diários de Motocicleta, de Walter Salles e por isso, é inevitável não pensar no lindo trabalho do argentino Gustavo Santaolalla, também integrante do grupo Bajofondo e vencedor de dois Oscars por melhor trilha sonora original.

Gustavo Santaolalla - De Ushuaia a la Quiaca





Da Argentina pego a mochila rumo as sonoridades do Oriente Médio. Ao começar com trilhas instrumentais, repletas do espírito andarilho, me deparo com este grupo de Amnan, na Jordânia: Zaman Al Zaatar. O grupo tem três álbuns e uma das coisas que mais me fascina é o aláude, instrumento frequentemente usado na música típica da região:

Zaman Al Zaatar - Um Aldunya





Saindo da Jordânia, voltei para o Brasil, precisamente para Porto Alegre, onde um compositor gaúcho tem o dom mostrar a beleza de diferentes instrumentos em suas músicas. Angelo Primon é daqueles caras que domina com primazia viola de 10 cordas, viola de cocho, cítara:



Ao som de tantas canções em línguas e culturas diferentes, me pergunto ainda se o mundo teria conhecido a história de Alex Supertramp, se o objetivo de chegar ao Alasca e voltar, quem sabe, para casa, tivesse ocorrido. A melodia, o timbre, o acorde de uma trilha instrumental tem o poder de nos levar para lugares num piscar de olhos, num instante de silêncio da alma. Seja para um destino longínquo, ou sem sair da poltrona, viver o trajeto dessa viagem cabe a nossa coragem de saber que ao chegar em algum lugar, já não seremos mais os mesmos.

Perdeu o #Wanderlust na On the Rocks? Então ouça o programa:



sábado, 31 de maio de 2014

That's what JAZZ is all about!

Paraty, no Rio de Janeiro, a capital brasileira do jazz


A chegada de um final de semana cinzento e chuvoso, pós-céu-azul-escarlate, anuncia que o inverno vem vindo, chegando de mansinho, trazendo a trilha sonora perfeita na bagagem: um jazz na vitrola, enquanto se completa aquela taça de vinho, com o fogo da lareira ao fundo, serpenteando. E por causa dessa imagem na minha cabeça, se algum dia me pedissem para criar um roteiro de viagem, eu esqueceria "Itália Romântica" ou "Artística", "Índia Espiritual", "Espanha Flamenca". Sem dúvidas, eu quebraria a banca de uma vez por todas: pegaria minha mochila e sairia rumo aos melhores festivais de jazz do mundo! E foi pensando nessa trip, que elaborei o roteiro de viagem musical no #Wanderlust #8, que foi ao ar na última quinta-feira na On The Rocks.

Preservation Jazz Band, no Bourbon Festival Paraty, no último final de semana

Iniciei o programa partindo de uma cidade histórica linda e extremamente cultural: Paraty, no Rio de Janeiro. Todos os anos acontece o Bourbon Festival, que chegou agora a sua 6ª edição. O festival sempre começa na sexta-feira e encerra no domingo. Os shows, além de acontecerem em dois palcos, circulam também pelas esquinas. Sendo assim, a qualquer momento, você pode cruzar com um show numa daquelas ruazinhas antigas, de forma acústica e bem informal. Uma das grandes atrações esse ano foi a mais antiga banda de jazz do mundo, a Preservation Hall Jazz Band, de New Orleans e há 150 anos em atividade:



Preservation Hall Jazz Bande - Tailgate Ramble




O mestre Hermeto Pascoal foi quem abriu os trabalhos na sexta-feira do Bourbon Festival. O compositor, arranjador e multi-instrumentista brasileiro é nome cativo nos maiores e mais conceituados festivais mundo a fora:


Hermeto Pascoal e Aline Morena - Depois do Baile ou Circo Voador



Curiosidades a parte, ao lado da cantora americana de jazz, Patti Austin, estava o guitarrista gaúcho Sandro Albert, um jazzista natural de Porto Alegre, autodidata e que com cara e coragem, se mudou para os Estados Unidos para dar início a carreira. Tanta determinação que foi tocar com War, Earth, Wind & Fire e agora com uma das grandes damas do jazz.


Patti Austin & Take 6 - How high the moon



Sandro Albert - Soul People



Outra banda que esteve no Bourbon Festival e passeou pelas ruas de Paraty foi Mustache e Os Apaches, que nasceu da excentricidade de músicos, que amam circo, artes plásticas, cinema e literatura. A banda é formada pelos gaúchos: Pedro Pastoriz (Voz, Violão e Banjo), Tomás Oliveira(Contrabaixo e voz), Axel Flag (Voz e percussão), Jack Rubens (Bandolim), e por Lumineiro, de Belo Horizonte, que toca o original Washboard, uma antiga tábua de lavar roupa. Eles se inspiram em Jug Bands norte- americanas ( aquelas que criam os próprios instrumentos com utensílios domésticos) e no Circo Vaudeville, ou seja, espetáculo burlesco:

 Mustache e Os Apaches - Twang



Saindo de Paraty, aterrissei no line-up do Java Jazz Festival, que aconteceu no final de fevereiro, início de março,  na Indonésia, e descobri a dupla de guitar heroes, Dewa Budjana & Tohpati, ambos colaboradores com muitos artistas locais e que tem como influências Pat Metheny, Jeff Beck, Chick Corea:


Dewa Budjana & Tohpati - Dan



Da Indonésia, fui até o Copenhage Jazz Festival,  na Dinamarca, que acontece de 4 a 13 de julho. Entre as atrações, uma voz peculiar: a da cantora espanhola, nascida em Mallorca, Buika, nominada em 2008 no Grammy Latino, como Álbum do ano. Porém, minha viagem continua até Sarajevo!


Buika - No habrá nadie en el mundo



A maior cidade da Bósnia Herzegovina também tem um festival bacana e super reconhecido,o  Jazz Festival Sarajevo, que acontecerá de 4 a 9 de novembro. Uma das grandes atrações é o músico, compositor e arranjador, professor de trompete franco libanês Ibrahim Maalouf:



Ibrahim Maalouf - Obsession




Pegando o avião rumo ao Ocidente, não preciso nem dizer que nesse quesito, os norte-americanos nos oferecem um banquete musical jazzístico, de deixar qualquer amante do gênero de boca aberta, babando, pedindo repeteco. Por isso muito me agradaria ir nas próximas semana para São Francisco, na Califórnia, ficar na turma do gargarejo no San Francisco Jazz Festival e ouvir a dupla Magos Y Limón, projeto da cantora mexicana Magos Herrera e do madrilenho Javier Limón:


Magos Y Limón - Dawn




Mas para fechar a "mochilada jazzística", perfeito mesmo é acabar a viagem em dois berços da música: Chicago (em agosto) e Montreal, no Canadá, respectivamente. Fora as line ups recheadas de grandes nomes, o que me surpreendeu foram dois artistas novatos, que impressionam não apenas pelo talento, mas pela potência e capacidade em passar a própria alma naquilo que fazem. Falo da cantora, que parece ter saído dos grandes redutos de jazz dos anos 30 e 40, Cecile McLorin Salvant e do compositor e cantor inglês Benjamin Clementine. Apenas veja, ouça e tire suas próprias conclusões.


Vale ou não vale a pena, uma trip musical dessas? Acaba de entrar para a lista de coisas para fazer antes de partir dessa para uma melhor:

Cecile McLorin Salvant - If This Isn't Love




Benjamin Clementine - Conerstone

quinta-feira, 22 de maio de 2014

Bon Voyage à St.Marie!


Vila Belga, patrimônio histórico. Foto: Secretaria do Turismo de Santa Maria/RS

As casinhas coloridas são muitas. Bem preservadas, elas dão um tom alegre ao cotidiano comum da cidade. Construída entre os anos de 1901 e 1903, a vila foi projetada pelo engenheiro Gustave Wauthier para ser a nova moradia dos funcionários da companhia belga "Compagnie Auxiliare des Chamins de Fer au Brésil". Como? Você leu "Brésil"? Sim! Não estou em algum vilarejo da América Central, muito menos a foto é de alguma cidadezinha europeia. Toda essa riqueza arquitetônica mora aqui ao lado, precisamente na cidade de Santa Maria, onde essa "Compagnie" adquiriu a concessão e finalizou a construção da Estrada de Ferro Porto Alegre-Uruguaiana, um projeto de articulação do território e das fronteiras do Estado do Rio Grande do Sul com a Argentina, Paraguai e Uruguai. Agora tente não se revoltar, caro leitor, ao saber que você poderia estar, sim, viajando todo o território do falido Mercosul, apenas de trem!


Encantada ao passear por essas ruazinhas, de imediato pensei em colocar no primeiro bloco do #Wanderlust #7 dessa quinta-feira, um guitarrista de jazz belga que conheci por causa do toca-discos bacana do meu amigo Márcio Grings, um santa-mariense da gema, que me levou para ver essa cidade de perto, berço da On The Rocks. Ouvi pela primeira vez, Django Reinhardt, um sujeito de alma cigana e que influenciou posteriormente músicos, criando o estilo gypsy jazz, um dos meus favoritos:

Django Reinhardt - The Best of Django Reinhardt




Entre um passeio a Silveira Martins, um pulo no balneário Novo Pinhal - uma bela surpresa, pois não imaginava que a cidade e seus arredores tivessem vários locais para banho, em cima das montanhas! - recordei da minha infância ao lembrar do gosto do meu pai por estar no meio do mato, acampando, e principalmente, da preferência dele pelos vinis de western do meu avô. Sendo assim, ouvi um dos discos mais bacanas do gênero, que mudou minha opinião a respeito. Pat Garrett & Billy The Kid, trilha sonora criada por Bob Dylan, para o filme de mesmo nome, lançado em 1973. Se eu já cantava desde a minha infância essa música na voz do Axl Rose, a original, pelo próprio Dylan, me arrebata:

Bob Dylan - Knockin' on Heaven's door




As audições de grandes vinis eram pausados por leituras de trechos de um livro, que há tempos eu queria muito já ter devorado. Todo bom mochileiro, aquele com espírito desbravador de verdade, tem esta obra, mesmo que sem querer, como uma de suas favoritas: Na Natureza Selvagem, de Jon Krakauer.




Já em em casa, no sítio em Gravataí, eu continuava a leitura, mas minha trilha sonora começava a fazer as malas e saía dos Estados Unidos rumo à Cuba, um dos lugares que certamente estão no meus próximos roteiros de viagem. Ouvia a parceria de Omara Portuondo, cantora de bolero e dançarina cubana e minha diva brasileira Maria Bethânia, que juntas em 2008, gravaram um disco lindo e saíram em turnê:


Omara Portuondo e Maria Bethânia - Tal Vez



E já que falamos de divas, peguei meu mapa sonoro e para continuar a leitura, eu aterrisei no México. Poucos artistas me comovem tanto. E uma dessas estrelas da vida se chama Chavela Vargas, diva dos anos 50 e amiga íntima de Frida Kahlo.



A expressividade dessa mulher, intensidade e modo choroso de cantar, sempre fazem com que eu termine a audição da faixa com lágrimas rolando. Depois de ter problemas com álcool, Chavela volta a cena musical em 1992, por intermédio do meu cineasta favorito, o espanhol Pedro Almodóvar. Ela faleceu em 2012.

Chavella Vargas - En el ultimo trago



Aí, vou até a casa de um amigo querido e ele diz: "Amanhã embarco! Vou à Paraty, para mais um Bourbon Festival"! Tudo o que eu queria era curtir aquela cidadezinha histórica, tendo como trilha sonora das minhas andanças, o jazz que ecoará por todas suas esquinas. Fotógrafo por hobby, Hamilton Fialho mandará retratos na próxima semana para o site da On The Rocks e contará como foi a aventura de mais uma reunião de jazzistas do mundo! O mais divertido sempre são os nomes desconhecidos e a maneira surpreendente que esses artistas "anônimos" te pegam de modo despretensioso! Se há viagem mais saborosa, e ao mesmo tempo, difícil de traçar um roteiro linear e racional, não tenha dúvidas, caro leitor: é a viagem musical, seja ela em Santa Maria, New Orleans, Bélgica, Cuba ou Paraty!

Dois dos artistas incríveis, que estarão na edição do Bourbon Festival, que começa nesta sexta-feira e vai até domingo, em Paraty. Salve para Hermeto Pascoal, nessa canção com a eternamente estupenda, Elis Regina!

Hermeto Pascoal e Elis Regina - Asa Branca



Preservation Jazz Band - Tailgate Ramble


sexta-feira, 16 de maio de 2014

Take it easy, my brother...


Momento de louvor da qawwaali, uma crença corrente do Islamismo. Foto: Rasha Yousif


De forma mística, introspectiva, silenciosa. PARAR, ainda que por míseros minutos, é VITAL. Pegar carona na brisa que toca as árvores, perceber a dança do vento que arrasa e encosta gelado nas pálpebras. Apreciar uma leitura sem hora para virar a última página, entoar um canto com toda a devoção, se deixando levar pela batida de tambores, erguer as pernas numa rede, sentindo o sol entre rápidas nuvens. As voltas do cotidiano nos fazem perder esses momentos que nos são tão caros. Nos imbuímos de preocupações que anulam nossos sentidos, e deixam de lado a verdadeira beleza do mundo gigante, o real. Por isso, com filosofia "mente quieta, espinha ereta e coração tranquilo", o Wanderlust #6 traçou um roteiro sonoro de viagem nessa quinta-feira na On The Rocks, com a intenção de reduzir a sua velocidade, querido leitor.

Há tempos eu escutei o nome de Jeff Buckley. Porém, funciona como livros que param em nossos braços e não colocamos atenção, por estarmos em momentos diferentes. Você dirá: "Ouça isso, pois é genial!". Vou lá, escuto meia dúzia de faixas. Ou me apaixono, ou simplesmente deixo de lado. Anos após, vem a descoberta, quase atônita. "Como eu não tinha escutado isso antes?" E a razão é facilmente compreendida: aquele não era o MEU tempo certo. Sendo assim, o impacto provocado pelo álbum Grace (1994), alçou a obra como minha favorita. Isoladamente, nunca tive ninguém nesse posto por entender a música como a forma mais bela e ampla de uma manifestação artística. Mas quando um disco dialoga com a sua vida, realmente, o buraco é BEM mais embaixo.

Jeff Buckley - Grace


Sem pensar na profundidade das letras, há coisas no cantor, compositor e guitarrista norte-americano, que trago na minha bagagem musical desde a infância, quando peguei um violão e, desesperadamente, queria aprender Stairway To Heaven, do Led e Paranoid Android, do Radiohead. O próprio Robert Plant rasgou elogios à Buckley. Entendo: ambos tinham apreciação por fraseados e arranjos em timbres orientais, vide Last Goodbye, de Grace. Posteriormente, o jeito espontâneo, quase torto de cantar e tocar de Buckley, imprimiu traços nas características "on stage" de Thom Yorke e Chris Martin, do 
Coldplay. Mesmo tendo ficado arrasada ao saber que morreu afogado em 1997, ao nadar em afluente do rio Mississipi, antes de ir para um ensaio com a banda, é perceptível que a história de alguns mestres da música tem de ser assim, para que imortalizem suas próprias histórias de vida, nas nossas.

Jeff Buckley - Last Goodbye


Descobri ainda, que Buckley estava perplexo com o talento de Nusrat Fateh Ali Khan, músico paquistanês, que ele por acaso ouviu entoando cânticos, ao lado do quarto onde estava no Harlem, 1990. Listado em 2006 pela revista Time como um dos "Heróis da Ásia", Nusrat era mestre em qawaali, um estilo musical Sufi, corrente do Islamismo, principalmente em Punjab e Sindh, regiões do Paquistão, Hyderabad e Delhi, na Índia, que utiliza cânticos e danças, o que é considerado ilegal por muitos muçulmanos. Buckley ficou extasiado:

"The phrase burst into a climax somewhere, with Nusrat's upper register painting a melody that made my heart long to fly. The piece went on for fifteen minutes. I ate my heart out. (...) At times I've seen him in such a trance while singing that I am sure that the world does not exist for him any longer. The effect it has is gorgeous. These men do not play music, they are music itself".


Nusrat Fathe Ali Khan - Allah  Hoo


Bem mais perto, por esses continentes do lado de cá, outros cantos tiveram sobre mim, um efeito parecido. O álbum Music for The Native Americans, produzido pelo guitarrista e compositor canadense Robbie Robertson foi feito para o documentário de TV americana, que rodou em 1994, chamado The Native Americans. O filme explora a história dos índios nas Américas, bem como suas culturas, na qual a cada uma hora, das seis do documentário, mostra uma região particular dos Estados Unidos.



Impossível seria, ao falar em índios, não relembrar as minhas raízes, assim como a de milhares de brasileiros. Embora não tenha guardado o retrato da minha bisavó paterna, por parte de minha avó, bastou eu ver a imagem em preto e branco daquela índia de cara bem quadrada, retirada no interior de Bagé, para nunca mais me esquecer de onde eu vim. Próximo a minha realidade, não conheço exemplo maior de povo que sabe não só apreciar, mas que compreende o papel fundamental da natureza e sua contemplação nas nossas vidas. Por isso, rodei o som extraído do álbum Memória Viva Guarani (2000) gravado com 300 crianças de tribos guarani e tupi-guarani do Rio de Janeiro e São Paulo. No canto, que significa "Nossos pais são o vento e o trovão", as crianças evocam "o espírito ancestral em cada um de nós e, deixando claro a importância dos cânticos em cada situação de nossa existência".

Ñande Reko Arandu ''Memória Viva Guarani'' - Oreru nhamandú tupã oreru